Em artigo no "The Conversation", cientistas da Universidade de Leeds trazem estimativa de que a quantidade de plástico que chega ao meio ambiente marinho deve dobrar daqui 20 anos – mas sugerem formas de mudar esse quadro preocupante
É previsto que 480 milhões de toneladas de lixo plástico serão descartadas em rios e mares se nenhuma atitude for tomada para conter essa poluição (Foto: Brian Yurasits / Unsplash) |
Durante uma visita a uma livraria algumas semanas atrás, nós não pudemos evitar ficar encarando uma prateleira que tinha pelo menos 10 livros que ensinavam como se livrar de plásticos no seu cotidiano. Somos bombardeados por informações sobre o tópico dos detritos marinhos e da poluição por plástico, mas quanto que realmente sabemos sobre esse problema?
Pense em outros desafios planetários, como as mudanças climáticas ou a rarefação da camada de ozônio. Áreas maduras de pesquisa foram desenvolvidas ao redor deles, permitindo cientistas a identificarem de onde gases que causam esses problemas vêm, e qual quantidade deles atinge a atmosfera a cada ano.
Mas quando se trata da poluição por plástico, sabemos quase nada sobre como e onde dejetos plásticos são gerados, gerenciados, tratados e descartados, especialmente em países emergentes e subdesenvolvidos. Como resultado disso, temos dificuldade em limitar a quantidade de lixo que se acumula no meio ambiente.
Nossa pesquisa publicada na Science envolveu um esforço hercúleo para encontrar, monitorar e fazer o modelo do escoamento atual e futuro de plásticos até o solo e corpos de água. Descobrimos que o plástico que chega ao meio ambiente marinho deve dobrar até 2040 e, se o mundo não agir, mais de 1,3 bilhão de toneladas de plástico serão descartadas em solos e corpos de água.
Ao identificarmos as maneiras como esse lixo é produzido e distribuído, também descobrimos qual é a melhor forma de reduzir a avalanche de plástico. Nesse processo, encontramos os heróis desconhecidos na linha de frente da luta contra a crise de poluição que poderiam ser a melhor esperança do mundo para conter a maré.
Modelo científico sugere que mais de 2,2 bilhões de toneladas de plástico serão queimadas a céu aberto até 2040 (Foto: Lucien Wanda / Pexels) |
O problema plástico do mundo em números
Nós desenvolvemos um modelo chamado Plastic-to-Ocean (P₂O), que combina anos de conhecimento adquirido sobre os fluxos globais do plástico. Ele compara nossa produção atual, o uso e o gerenciamento de resíduos com o que é projetado para o futuro.
Você queima seu lixo no jardim ou na rua? Você o joga no rio? Se você respondeu não a ambas as perguntas, é possível que você seja uma das 5,5 bilhões de pessoas cujo lixo é coletado. Se você estivesse entre os dois bilhões restantes de pessoas, o que faria com o seu lixo não coletado? Você usaria um riacho próximo a você, uma borda de penhasco ou, talvez, deixaria o estranho saco de dejetos em uma floresta após o anoitecer?
Na maioria das vezes, o lixo plástico não coletado é simplesmente incendiado, como um método de descarte eficaz e sem custo. Nosso modelo sugere que, cumulativamente, mais de 2,2 bilhões de toneladas de plástico serão queimadas a céu aberto até 2040 – muito mais do que as 850 milhões de toneladas previstas para serem despejadas em terra e as 480 milhões de toneladas que irão a rios e mares.
Depois de rastrearmos as fontes de itens de plástico na cadeia de suprimentos e o destino deles no meio ambiente, investigamos o que pode ajudar a reduzir a poluição aquática. Descobrimos que a intervenção mais eficaz é fornecer um serviço para os dois bilhões de pessoas que atualmente não têm seus resíduos coletados.
Plásticos encontrados na praia de Kamilo, no Havaí (EUA) (Foto: Flickr/Gabriella Levine/Creative Commons) |
Mas, das nove intervenções que testamos, nenhuma resolveu o problema por conta própria. Somente uma abordagem integrada que, além de aumentar a cobertura da coleta de lixo, inclua intervenções como a redução da demanda por plástico descartável e não reciclável e a melhoria do plano para a reciclagem mecânica, pode sem bem-sucedida. Para os países que mais sofrem com a poluição por plásticos, esse conhecimento pode oferecer um caminho a ser seguido.
Mas mesmo no nosso melhor cenário, no qual o mundo tomaria o tipo de ação organizada e imediata que foi proposta em nosso estudo, aproximadamente 710 milhões de toneladas de resíduos plásticos seriam descartadas no meio ambiente até 2040. Isso pode parecer muito, mas significaria uma redução de 80% nos níveis de poluição por plástico em comparação com o que acontecerá se nenhuma atitude for tomada nas próximas duas décadas.
Os catadores poderiam salvar o dia?
Nosso trabalho também esclareceu as contribuições feitas pelos 11 milhões de catadores em países emergentes e subdesenvolvidos. Esses trabalhadores informais coletam itens de lixo – incluindo plásticos, para reciclagem – para garantir um meio de sobreviverem. O modelo estima que essas pessoas podem ser responsáveis por 58% de todo o lixo plástico coletado para reciclagem no mundo todo; mais do que os serviços de coleta formal combinados conseguem fazer em todos os países desenvolvidos juntos.
Sem esse setor informal de coleta de lixo, a massa de plástico que chegaria aos rios e ao oceano seria consideravelmente maior. Os esforços [dos catadores] devem ser incluídos nos planos de gerenciamento de resíduos municipais; não apenas para reconhecer a tremenda contribuição deles, mas também para melhorar os terríveis padrões de segurança de que eles dispõem atualmente.
O modelo estima que catadores de recicláveis são responsáveis por 58% de todo o lixo plástico coletado para reciclagem no mundo todo (Foto: Avinash Kumar / Unsplash) |
Estabelecer uma estimativa abrangente das fontes, dos estoques e dos fluxos de poluição por plásticos e depois fazer uma projeção para o futuro tem sido uma tarefa imensa. Quando se trata de resíduos sólidos, a disponibilidade, a precisão e a compatibilidade internacional dos dados são notoriamente insuficientes.
Itens de plástico aparecem em todo o mundo em dezenas de milhares de formas, tamanhos, tipos de polímeros e combinações de aditivos. Além disso, existem diferenças culturais consideráveis quanto à maneira como o lixo é gerenciado e como os produtos plásticos são consumidos, e também em relação aos tipos de infraestrutura e de equipamentos usados para gerenciar o lixo quando ele se torna resíduo.
Nosso esforço para fazer um modelo foi um exercício delicado e tedioso de simplificar e generalizar essa complexidade. Para entender o quão confiáveis, exatas e precisas nossas descobertas podem ser, pense nos primeiros modelos que estimaram o quão sensível o clima é à influência humana na década de 1970.
Esperamos que as fortes evidências que apresentamos hoje informarão uma estratégia global e uma forte ação preventiva local. O desafio da poluição por plásticos pode ser substancialmente controlado daqui uma geração. Então, alguém está pronto para agir?
*Costas Velis é professor de Sistemas de Eficiência de Recursos na Universidade de Leeds. Ed Cook é pesquisador da área de Sistemas da Economia Circulas da Universidade de Leeds.
Texto originalmente publicado em inglês no The Conversation.
Galileu