Polícia prende fazendeiro por mandar matar ex-funcionária com quem teve um filho

Triplo homicídio: um mês após o crime, polícia aponta fazendeiro e sua esposa como mandantes do assassinato de Diênifer Padia, do cunhado dela e da sobrinha de 15 anos. Enredo trágico e cinematográfico envolve gravidez, relação extraconjugal, ex-PM e a dor da única sobrevivente


Diênifer, Alessandro e Kétlyn
Diênifer, Alessandro e Kétlyn


Publicado no Pragmatismo Político

Um fazendeiro rico e influente, de 42 anos, foi preso na manhã do último sábado (27/6) na cidade de Casca, Rio Grande do Sul. Ele é apontado como um dos mandantes do assassinato de Diênifer Padia, de 26 anos. O crime aconteceu na noite de 19 de maio, em Passo Fundo (RS).

Até a publicação deste texto, a polícia não divulgou o nome do fazendeiro, mas afirmou que a esposa do homem também está envolvida no crime. Além de Diênifer, morreram o cunhado Alessandro dos Santos, de 34 anos, e a sobrinha Kétlyn Padia dos Santos, de 15 anos. Todos foram amarrados e asfixiados.

Segundo a investigação, o triplo homicídio apresenta um enredo típico de romance policial. Diênifer trabalhou na propriedade do fazendeiro em Casca (RS) durante 3 anos, manteve uma relação extraconjugal com o chefe e engravidou.

A esposa do fazendeiro descobriu o romance e Diênifer acabou demitida em março deste ano. A jovem retornou para sua cidade de origem, Passo Fundo (RS).

Em Passo Fundo, Diênifer passou a receber ameaças de morte. “Ela recebeu uma caixa de sapato com uma boneca, sem membros e com manchas vermelhas como se fossem sangue, ameaçando-a de morte”, observa a delegada responsável pela investigação, Daniela Minetto, salientando que a jovem registrou um Boletim de Ocorrência.

Na mesma época, saiu o resultado do exame de DNA na criança, que comprovou a paternidade do ex-chefe de Diênifer. “Ele soube extraoficialmente do resultado, já que o fórum cessou as atividades em razão da covid-19”, disse a delegada.

Conforme a investigação, Diênifer recebeu uma casa e um cartão de crédito para custear as despesas com a criança, hoje com um ano e meio. Ela também se preparava para abrir uma loja de roupas após o fim da pandemia.

Ainda segundo a delegada, após o resultado do DNA, a mulher do fazendeiro pediu ajuda ao irmão para articular o assassinato de Diênifer. Eles contrataram um ex-policial militar para executar o crime.

O ex-PM, exonerado da corporação há mais de 20 anos, já está detido desde 19 de junho. Ele teria sido o responsável por revelar toda a trama.

A esposa do fazendeiro e o irmão dela não foram localizados durante cumprimento de mandado de prisão, por isso são considerados foragidos.

Na residência do ex-PM foram encontrados R$ 17,5 mil em dinheiro, além de armas ilegais. As investigações apontaram que teria sido oferecido R$ 25 mil e R$ 30 mil para quem matasse Diênifer. A polícia acredita que o cunhado e a sobrinha foram assassinados para não deixar testemunhas.

“Mataram pai e filha como queima de arquivo, para não ter testemunha. Os executores previam que pudesse ter mais gente na casa. Eles foram preparados para matar mais gente, pois tinham diversos lacres que usaram para asfixiar as vítimas”, disse a delegada, afirmando que o ex-PM contou com a ajuda de outros comparsas que ainda estão foragidos.

O fazendeiro, a esposa, o irmão dela e o ex-PM podem responder por homicídio com as seguintes qualificadoras: pagamento de recompensa, asfixia, emboscada e feminicídio. Nenhum dos nomes dos acusados foi divulgado até agora.

“Não tenho mais ninguém”

Diênifer vivia em uma casa em Passo Fundo com seus três filhos — dois meninos, um de seis e outro de três anos e uma bebê de um ano e meio, fruto da relação extraconjugal. Na mesma casa, viviam a irmã de Diênifer, Ana Paula, 31 anos, o cunhado Alessandro e a sobrinha Kétlyn – os dois últimos, mortos em 19 de maio.

Sobrevivente do crime, Ana Paula está longe de superar a dor. A técnica de enfermagem perdeu a irmã, o marido e a filha. “Não consigo comer, não consigo dormir. Cada dia é pior. Não sei o que vai ser da minha vida sem eles. Me deixaram sozinha, não tenho mais ninguém, minha família se foi. Eu ia trabalhar, eles me levavam até a parada de ônibus. Eu chegava em casa, abriam a porta para mim”.

No dia do crime, Ana Paula tinha encerrado um plantão pesado de 12 horas no Hospital de Clínicas de Passo Fundo. Ela trabalha na linha de frente do combate ao coronavírus.

No fim do expediente, às 8h da manhã, voltou para casa exausta e ainda cuidou dos sobrinhos, enquanto a irmã Diênifer Padia, 26 anos, estava na rua. Venceu o cansaço ao longo do dia sem imaginar que aquele dia terminaria muito pior do que começou.

Quando Ana Paula enfim conseguiu fechar os olhos sobre a cama, por volta das 21h, na casa dos fundos, o marido Alessandro, a filha Kétlyn e a irmã Diênifer foram amarrados e asfixiados na residência da frente.

Horas antes do crime, nada da rotina da família poderia supor que ela seria dilacerada ainda naquela noite. O pai levou a filha ao dentista à tarde e marcaram a extração de um dente para o sábado seguinte. Após o jantar, Kétlyn foi tomar banho. A última lembrança de Ana Paula é de ter visto a filha secando cabelo.

“O Alessandro cozinhava, aquele dia fez a janta. A gente jantou, ele tomou duas latinhas de cerveja. Deitei no colo dele. Kétlyn foi tomar banho. E depois fui dormir na outra casa [dos fundos], eu e o Alessandro só dormíamos naquele quarto. Não sei quanto tempo dormi mas me acordei com um policial no meu quarto. Levei um susto e perguntei: o que houve? Ele não me disse nada, só me trouxe até eles. Eu fiquei em choque quando vi eles no chão. Ninguém me dizia o que tinha acontecido. A minha irmã e meu marido estavam na sala. A Kétlyn estava na porta do quarto. Ainda disse para uma policial: “estão com vida”. Me ajoelhei. Queria fazer qualquer coisa”.

Juntos há 16 anos, a adolescente era a filha única do casal. Santos foi o primeiro namorado de Ana Paula e o casal morava de forma provisória na casa de Diênifer. Eles pretendiam, até o final do ano, comprar uma casa própria e ter mais um filho.

Além do luto, Ana Paula conta que tem sofrido especialmente com comentários que questionam como ela não ouviu, mesmo dormindo, nenhum sinal do crime que estava acontecendo na casa da frente.

“Se eu tivesse ouvido qualquer coisa, teria ido correndo acudir. Jamais ia deixar minha filha passar pelo que passou. Eu tinha entregado a minha vida por ela. Como eu ia deixar a minha filha morrer e não ia fazer nada? Ou eu tinha morrido ou tinha matado esses demônios. Sempre jurei que daria minha vida por ela. Eu trabalho dentro de um hospital, sei o que é o sofrimento das pessoas. Ninguém está dentro de mim para saber o que eu estou passando”.


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