Cálculo de cientistas brasileiros coloca o país como novo epicentro do coronavírus no mundo, à frente dos EUA. Número é 12 vezes superior à contagem oficial, que sofre com subnotificação.
Cemitério em Manaus. País começa a se aproximar da marca de 10 mil mortes por covid-19 |
Um estudo realizado por cientistas brasileiros aponta que o número real de casos de coronavírus pode ser superior a 1,6 milhão. O número é bastante superior à contagem do Ministério da Saúde, que identificou até esta quinta-feira (07/05) 135 mil casos.
Os dados do estudo foram publicados nesta semana no portal Covid-19 Brasil e divulgados nesta quinta-feira pela Agência Fapesp. De acordo com o estudo, o estado de São Paulo pode ter concentrado até o dia 4 de maio pelo menos 526 mil casos. Os dados sugerem que o Brasil pode ser o novo epicentro da doença no mundo, ultrapassando os EUA, país que oficialmente soma mais casos, com 1,25 milhão registros de covid-19.
Até a terça-feira, Brasil tinha realizado apenas 1.597 testes por milhão de habitantes. Os Estados Unidos, por exemplo, conduziram 22.591 testes por milhão de pessoas, segundo a empresa de dados Statista.
"É sabido que existe uma grande subnotificação de casos no Brasil todo, pois só se estão sendo testados os casos graves, de quem vai para os hospitais. Mas de quanto é essa distorção da realidade? A motivação deste estudo é, de alguma forma, contribuir para o planejamento da epidemia, pois com essa subnotificação tremenda só estamos vendo a ponta do iceberg”, diz Domingos Alves, integrante do grupo COVID-19 Brasil, formado por cientistas de mais de dez universidades brasileiras para monitorar a pandemia.
O pesquisador, que também atua como coordenador do Laboratório de Inteligência em Saúde (LIS) da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, ligada à Universidade de São Paulo (USP), aponta ainda que uma estimativa mais realista do número de casos de coronavírus no país permitiria que governos e população tivessem maior capacidade de planejar medidas de combate à pandemia.
"Para ter uma noção real da dimensão, o ideal seria testagem em massa. Como não temos testes disponíveis para todos, as estimativas podem servir de base para o gerenciamento de medidas de confinamento, necessidade de novos leitos e da abertura de hospitais de campanha”, afirma Alves.
Para chegar ao número superior ao registro oficial, os pesquisadores se basearam em dados epidemiológicos da Coreia do Sul e ajustaram fatores como pirâmide etária, porcentual de comorbidades e fatores de risco para covid-19 na população brasileira.
"Aparentemente, o número de óbitos é um preditor para o número de casos. Já se sabe que a taxa de letalidade em diferentes países é mais ou menos fixa: 5,8% do total de casos”, diz.
Alves apontou ainda que existe também grande subnotificação dos casos de morte. "Há uma discrepância. Em meio a uma epidemia, pessoas morrem com sintomas de COVID-19, mas permanecem como casos suspeitos, pois não foram e nem serão testados. Em muitas cidades já está acontecendo de as pessoas morrerem em casa, sem receberem nenhum atendimento. É a subnotificação das mortes. Trabalhamos com base apenas nas mortes confirmadas”, completa.
Como há subnotificação até mesmo em relação às mortes, o pesquisador adverte que realidade deve ser ainda mais grave que a estimativa do estudo. "É muito possível que seja 20 vezes pior do que os dados oficiais estão mostrando”, finaliza.
DW